Avisem ao prefeito: por vaidade caiu Lúcifer

(Stephson Kim)

Lúcifer foi provavelmente o primeiro ser da criação a trabalhar a ideia do “eu” em detrimento do “nós” ao se olhar no espelho e achar-se mais bonito que todos se viu “individuado”, a parte.

O “portador da luz” (significado de Lúcifer) ao dizer EU, quebra o ritmo da criação que havia sido concebida sob a ideia do NÓS, tornando-se individuado na sua vaidade, o arcanjo fica tão pesado que cai do céu.

O combate do príncipe dos demônios com os 2/3 dos anjos que restaram fiéis a Deus, foi liderado pelo anjo Miguel. Na obra “O Paraíso Perdido” do poeta Milton do século XVII, Miguel luta contra Lúcifer derrotando-o e lançando-o vencido no inferno quando neste momento Lúcifer é indagado por um de seus “assessores” que diz:

– Que triste, não é mesmo? Agora para você, nunca mais o céu!

Ao que Lúcifer responde a famosa frase que seduz muitos (políticos) até hoje:

– Eu prefiro ser senhor no inferno do que escravo no céu!

É uma vaidade universal que se funda na história, isto é, surge a grande transformação na mitologia bíblica a partir do pecado de Lúcifer, já que os outros pecados, – a desobediência de Adão e Eva, o homicídio de Caim – são todos pecados posteriores.

Numa das traduções do antigo testamento no livro de Eclesiastes, vemos logo no primeiro capítulo, versículo dois; “vaidade das vaidades, tudo é vaidade. Que proveito tira o homem de todo o trabalho com que se fadiga debaixo do sol? Uma geração vai e outra vem e a terra sempre permanece. Toda palavra enfadonha, ninguém é capaz de explicar, o olho não se sacia de ver, o ouvido não farta de ouvir, o que foi, será, o que se fez, se tornará a fazer. Nada há de novo debaixo do sol”.

Explico a comparação com nossos dias.

Não importa a experiência da população com os produtos políticos rotulados de “novo” nas gondolas eleitorais, a tradição à cada dois anos prova que a escolha da maioria sempre cai neste conto fabuloso, que enfatize-se, de novo não têm absolutamente nada. Desta forma o povo que se fadiga com o seu trabalho, paga impostos altíssimos, se vê enganado e abandonado nas atitudes de quem no máximo de sua vaidade, pesado e caído, foi escolhido por todos para ser senhor em lugar estranho ao que estava habituado. Realizando o mais do mesmo, repetindo e se aprofundando em erros gerenciais, de equipe e de estratégia. Escolhendo muitas vezes no tom da perseguição o “enfadonhamento” de toda uma gestão, dando perspectiva de repetição, sem novidade nenhuma debaixo deste forte sol amarelo do nosso sertão sudestino tocantinense.

Gostaria de lembrar a todos os gestores e legisladores representantes do povo de qualquer lugar, que possam vir a ler este editorial, tudo é passageiro! Por vaidade e orgulho, caiu Lúcifer do paraíso.

Os budistas alertam que, passada a sensação do prazer, a necessidade ressurge com mais intensidade. E que a vaidade das escolhas é, ao mesmo tempo a assombração da alma. Não pereçam seus mandatos à hybris do pão e circo.

A representação quase artística na frente de um poder deve urgentemente acabar e dar espaço à representação de anseios dos seus comuns que sofrem e não sofrem pouco diante de vaidades dos seus mandatários.

Mais uma vez vale lembrar que, para os mais religiosos a vaidade é um desvio ético, vício narcísico.

Vale inclusive destacar alguns momentos da mitologia clássica para aguçar o discernimento:

A GUERRA DE TRÓIA

A vaidade aparece na guerra de Tróia quando se torna um desequilíbrio. A deusa Éris (deusa da discórdia) ao não ser convidada para uma festa, se disfarça para lá estar secretamente e semear sua habilidade. Joga num salão lotado de mulheres uma maçã (pomo) de ouro e diz: “um pomo para a mais bela”. Está plantado o caos. Três das deusas mais importantes Afrodite (Vênus), Atena (Minerva) e Hera (Juno) dizem que são as mais belas e perguntam ao marido e pai, Zeus, que tome uma decisão, mas Zeus não quer problemas e elege então um juiz, Paris, para decidir quem é a mais bela.

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As deusas oferecem a Paris as mais preciosas dádivas, Atena oferece poder total, Hera oferece sabedoria e Afrodite lhe presenteia com a mulher mais bonita do mundo e totalmente apaixonada por ele. Paris então declara que Afrodite é a mais bonita, recebe Helena de Tróia e com isso começa uma guerra de dez anos.

Este mito apresenta a vaidade dos deuses, que não são morais, já que são eternos.

O MITO DE ARACNE

Tomando outro caso da mitologia clássica, Aracne é uma humana com habilidade extraordinária na arte de tecer e que um dia comete o desequilíbrio de dizer que sua forma de arte e trabalho é melhor do que a da deusa dos artesãos Palas Atena que ao ouvir esta ofensa desce do monte olimpo à terra para tirar satisfações. A deusa pede para Aracne tecer, que faz algo extraordinário e belíssimo, Palas Atena sorri e começa a tecer como a deusa que é, Aracne vê aquilo e reconhece que a deusa é realmente superior para o padrão humano, mas já é tarde. Palas Atena a pune pelo insulto de se achar superior transformando-a em aranha, condenada por sua vaidade, passa a tecer pela eternidade.

RAINHA NÍOBE

O desequilíbrio aparece em mais um episódio mitológico importante, a estória da rainha Níobe que tem quatorze filhos, todos muito belos, um dia comete o disparate de se orgulhar demasiadamente disso dizendo que a rainha dos deuses, a grande deusa Hera tinha apenas dois filhos, sendo inferior a ela que tinha muito mais. A atitude a chamou para a briga. A rainha dos deuses encarregou seus dois filhos Apolo e Diana, excelentes arqueiros para matar todos os filho de Níobe, um a um na frente dela.

A mitologia ensina que os homens não podem se comparar com os deuses, por que os deuses são superiores. Os homens não devem pensar como os deuses pois estes são eternos.

É nessa tradição clássica e na tradição judaica que surgem as leituras sobre a vaidade – o grande pecado de se colocar a cima dos outros.

ENFIM ELE, NARCISO

Mas, o mito mais rico da vaidade e bastante ressignificado por Sigmund Freud está na figura de Narciso. Como se sabe, Narciso não poderia olhar sua imagem no lago, quando olhou pela primeira vez se apaixonou por si mesmo, ali estava definido o instrumento básico da vaidade, o espelho, o reflexo. A igreja medieval, inclusive, advertia que “há um demônio dentro de cada espelho”. Narciso não consegue mais tirar os olhos de si, fica inteiramente seduzido pela sua própria imagem e a ninfa Eco, apaixonada por ele o chama e recebe apenas sua voz, Narciso morre olhando sua imagem no lago.

A vaidade é condenada na tradição grega por ser uma hybris e é condenada na tradição judaico-cristã por ser uma falta de atenção ao Criador.

DE VOLTA AOS NOSSOS DIAS

Em tempos de selfs, risos abastados e constantes tapinhas nas costas, é preciso se atentar ao que estas passagens nos ensinam. Temos que ponderar a qualidade da cautela diante de políticos que se fecham em sua vaidade, são pessoas perfeitas, isto é, estão acabadas de conhecimento pois já sabem de tudo e nada e nem ninguém pode contribuir com uma crítica construtiva, uma ideia nova/ um novo olhar sobre determinados temas, pois, o ser mandatário, muito pesado na sua individualidade extremada, pode a qualquer momento se valer de seu poder para castigar, algo que visivelmente tem acontecido em larga escala, não só em Dianópolis.

Aos poucos a trama política que dividiu a cidade entre “nós e eles” está ruindo. A verdade é uma só. São eles e eles. Desde sempre. Grupo isolado, poderoso e que tem mostrado ao que veio. Nada, infelizmente há de novo debaixo do sol. Eu mesmo, confesso, esperava que uma forma nova e diferente de se fazer política ira gerir Dianópolis e tantas outras cidades. Mas, o que estamos a viver no dia-a-dia é a mais antiga das atitudes em política que se tem notícia, mas em Dianópolis ainda se pode salvar alguns poucos que revelam sua disposição e boa vontade em executar a missão que receberam e a fazem com extraordinário desempenho e resultados. São poucos e também são podados para não aparecer muito, enfatize-se.

À classe política não interessa um povo unido, fortalecido pelo mesmo desejo. As divisões entre nós fortalecem os conluios entre eles. Mais uma vez.

(Fontes de estudo: O essencial da mitologia – Baby Siqueira Abraão, Mitologia Nórdica-Reinaldo José Alves, O Livro da Mitologia-Luciano Alves, Pecar e Perdoar – Leandro Karnal)