BBB21: Se um negro erra, racismo condena população negra inteira sem 2ª chance, diz pesquisadora

A atual edição do programa Big Brother Brasil (BBB) é a que mais teve participantes negros e uma das que mais tiveram discussões dentro da casa sobre questões raciais e envolvendo minorias.

Letícia Mori

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Da BBC News Brasil 

Enquanto a identidade racial de algumas pessoas da casa foi questionada — como o economista Gil, que sofreu piadas quando disse que se considera negro — outros foram acusados fora da casa de “fazer militância errada” e serem hipócritas — como a participante Lumena, que falou diversas vezes sobre direitos LGBT, mas em outro momento questionou a sexualidade de um participante que se assumiu bissexual.

A pesquisadora Daniela Gomes critica a ideia de que as atitudes de participantes como Projota, Karol Conká e Lumena “prejudicam o movimento negro”.

“Eles estão ali representando um movimento, uma militância, ou estão representando a si mesmos?”, questiona Gomes, que é doutora pela Universidade do Texas e professora na Trinity College, em Connecticut, ambas nos Estados Unidos.

Generalizar atitudes vistas como erradas dos participantes como se fossem representativas do movimento negro (que é formado por muitos grupos e inúmeras entidades) é resultado justamente do racismo, diz ela.

“Nós pessoas negras não somos tratados como indivíduos, como pessoas passíveis de erros e acertos. Então se eu cometo um erro, como uma figura pública, quem está sendo tachado é a população negra. Isso volta lá na escravidão, a gente não entra na sociedade moderna como ser humano, entra como bicho. A gente não é individualizado, os nossos erros são sempre coletivos”, afirma.

Segundo Gomes, a forma com que conceitos da luta contra o racismo e o machismo são “jogados” de maneira superficial no programa acaba por banalizar temas de extrema importância e que deveriam ser tratados de forma séria e profunda — e não como “polêmica”.

“Ninguém que está assistindo aquilo ali está realmente preocupado com aquela pauta. A pessoa quando assiste BBB ela quer saber quem tá indo pra debaixo do edredom, quem tá brigando por comida. Se não você não vai assistir reality show. Eu vou assistir a minha própria aula (risos), vou ver o jornal.”

Por outro lado, diz, o interesse despertado por um programa tão popular pode ser uma oportunidade de explicar conceitos — fora do programa — para um público que nunca havia entrado em contato com certas discussões.

Gomes afirma também que a atitude dos participantes sequer deveria ser considerada ativismo. “Eles não estão militando, não têm como objetivo defender os direitos das pessoas, estão defendendo… Qual é o prêmio desse programa? É dinheiro!”, diz ela.

O prêmio para o último colocado a permanecer na casa após sucessivas eliminações é de R$ 1,5 milhão, mas os ganhos com a publicidade podem superar em muito essa quantia. Diversos ex-participantes — como a apresentadora Sabrina Sato e a atriz Grazi Massafera — fizeram carreiras muito lucrativas após deixar o programa.

Para a pesquisadora, no entanto, o que realmente preocupa não é como as pessoas podem generalizar atitudes de participantes considerados “vilões da edição”, como Karol Conká, mas os ataques e as ameaças violentas que eles podem encontrar do lado de fora.

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