Por que a aplicação da lei no Marco Temporal é tão tênue?

Questões sobre o direito da terra pelos indígenas voltam à discussão e exigem análise sensível para equilíbrio na decisão

A semana começa com expectativa do julgamento, pelo STF (Supremo Tribunal Federal), do chamado Marco Temporal, critério estabelecido na Constituição de 1988 para a demarcação de terras indígenas. O assunto voltou à tona no último mês de agosto, quando uma  fundação do estado de Santa Catarina, vinculada ao governo local, contestou, inclusive com documentos,ser dona da área, ocupada por indígenas. O julgamento no STF, que aconteceria no último dia 26 deve ser retomado na próxima quarta, 8.

Conforme a especialista em Direito Agrário, advogada Rita Rocha, antes de tudo é necessário deixar claro que a Constituição de 1988, no caput do seu artigo 231, diz que, entre outras coisas, “são reconhecidos aos índios (…) os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger  e fazer respeitar todos os seus bens”.  No entanto, lembra Rita, a brecha para a contestação da fundação catarinense para o caso em andamento no STF está “naquilo que não é tradicionalmente ocupado pelos indígenas”, ou seja, áreas invadidas pelos mesmos depois da Constituição de 1988, conforme alegado no processo, de que a etnia Xokleng teria tomado conta da terra já em 2009.

A questão em torno do julgamento específico desencadeia uma série de fatores que devem ser considerados. Segundo explica Rita Rocha, o primeiro é de que a decisão sobre o processo em questão foi classificado pelo STF como de repercussão geral, que vai servir de base  para casos semelhantes em outros tribunais, inclusive, por isso se justifica a manifestação de indígenas de todo o País em frente ao Congresso Nacional, sendo 200 deles de etnias tocantinenses.

 

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Entre tantas consequências, a especialista em Direito Agrário também reforça que, apesar da Constituinte buscar uma reparação pelos danos sofridos à comunidade indígena ao longo da história no Brasil, garantindo entre 10 a 14% do País a essa população, cerca de 300 territórios ainda têm situação jurídica indefinida. “A Constituição deu prazo até 1993 para que essa situação fosse resolvida”, informa a advogada, que acrescenta: “E dependendo da definição do Marco Temporal pelo STF, eles poderão facilmente ser expulsos, já que os processos de demarcação em andamento podem ser suspensos”.

Por outro lado, a utilização de indígenas por quem tem interesse na exploração de terras, também deve ser vista com perícia pelos legisladores. Afinal, há centenas de propriedades rurais ocupadas por famílias há gerações e que também podem ser prejudicadas, a depender da decisão do STF. “Nesse sentido, me parece razoável a manifestação do procurador geral da República, Augusto Aras, que propõe um parecer intermediário, em que caso a caso deve ser analisado”, finaliza Rita Rocha.

 

 

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Crédito da foto: Diego Sousa